Cap. 8 - Anos 1980
Falecimento:
Em 9 de maio de 1980, aos 53 anos, Nassif falece, de forma trágica, assassinado em um assalto na loja no fim do dia.
Nassif era o mais comunicativo dos irmãos, o dinamismo em pessoa, motivado, sorridente e inovador adorava uma boa conversa e fazer amizades, pai amoroso, um irmão que era amigo e amigo que era um irmão.
Estava cheio de planos, um deles era sair do comércio da 25 de Março e investir em outros negócios que possibilitaria passar mais tempo com a famÃlia.
Deixou-nos cedo, mas nos ensinou a inovar, viver com motivação e dinamismo, buscar sempre o melhor.
Um pai exemplar e um tio querido nosso amor e admiração são eternos.
Adorava futebol e era sãopaulino roxo.
Nassif e os filhos: Celso, Marcelo e Ronaldo nos anos 70.
Nassif Rayes, Chafik Rayes Jr. e Marlene Rayes e a famÃlia Mourad anos 70
Nassif Rayes, Chafik Rayes Jr. e Marlene Rayes e a famÃlia Mourad anos 70
NASSIF RAYES por Marcelo Rayes:
Meu Pai, Nassif Rayes
Meu pai sempre foi uma pessoa destemida. Filho caçula de uma famÃlia de seis, duas irmãs e quatro irmãos, nunca se quedou ao trabalho nem as obrigações que adorava cumprir.
Não me esqueço das milhares de vezes que me acordava ás 7 horas da manhã. Eu, sempre atrasado pela péssima mania de achar que "tudo dava tempo" via ele chegar à porta do meu quarto, abrir aquele sorriso e brincava comigo batendo continência. Vamos filho, vc. está atrasado, dizia. Achava que no dia seguinte se eu atrasasse ele iria ficar bravo. Nada disso. Sua postura era sempre a mesma. Vamos filho, precisamos correr. Era um barato. Talvez naquela simples brincadeira denotava ali um homem de grande rigor, caracterÃstica que o elevou a muitas conquistas profissionais. Claro dizer que meu pai não tinha o segundo grau completo, assim como não tinham seus irmãos. Mas isso nunca foi empecilho para obter suas conquistas.
Comerciante nato, caracterÃstica dos árabes, costume extremamente arraigado na cultura árabe, nunca deixou que o desânimo aflorasse os seus sentidos; agia com verdadeira maestria diante de várias situações embaraçosas. Discutia tudo, questionava tudo e era um grande observador.
Lembro-me de uma vez seu irmão (Mansur) me dizer da sua espantosa força e motivação para novos desafios. Sempre carregou um dilema tÃpico do comerciante da Rua 25 de Março, nas décadas de 50 á 80. Entendia que se ele revendia as mercadorias que todos seus concorrentes faziam comprando nas mesmas fábricas e condições, qual seria a razão de revendê-las em menor quantidade que a concorrência? A diferença não residia só no preço mas pela motivação em fazer negócio. E fazer negócio era uma coisa que ele mais sabia fazer como poucos que conheci. Adorava fazer conta. Meu pai não podia ver um pedaço de papel que puxava a caneta e rabiscava números e perspectivas de seu negócio.
Papai no lar era um verdadeiro brincalhão. Dizia sempre que dentro de casa não cabia discussão, briga ou questionamentos, coisas que ecoam nas pessoas bem sucedidas em sua profissão. Lá poderia ser o ringue, mas em casa ele sentava no divã. Dividia muito bem a questão trabalho versus casa.
Meu pai tinha dois costumes que, hoje, entendo como hobby: fazia coleção de whisky e todos os anos trocava o carro. Muitas vezes vÃamos seu último possante na garagem por semanas, onde só tirava no sábado para lavar e estacionar de volta na garagem. Eu sabia desde criança que seu prazer não estava somente nas compras, mas sim em deixar na garagem aquilo que adorava permanecer admirando. Nesse item seu irmão mais velho, Mansur, era idêntico.
Aliás, sobre essa similitude de ambos cabe um registro muito especial. Não por ter sido meu pai, longe disso, mas eu nunca presenciei tanto amor e ligação profunda que um tinha pelo outro. Onde estava o Nassif estava o Mansur e vice-versa. Viviam como vizinhos, trabalhavam como sócios, saiam como amigos e se identificavam como irmãos numa sintonia Ãmpar. Não posso esquecer-me de ter presenciado várias vezes uma cena que hoje comumente não a vejo. Quando não estavam juntos no trabalho se reuniam na porta de casa – eram vizinhos de parede – a conversar de negócios, famÃlia, viagens, planos etc. Tudo que um pensava o outro executava. Foi assim comprando um terreno e dividindo exatamente ao meio, onde construÃram a casa que até hoje minha mãe e minha tia – aliás irmãs – vivem. Os carros eram trocado em dois; o clube o qual frequentavam era o mesmo, os investimentos com imóveis eram feitos sempre em conjunto. Eu, ainda criança mas vendo tantas coisas assim fico a pensar que espécie de adoração foi essa que um nutria pelo outro. Misto de amor, admiração, compaixão e acima de tudo lealdade profunda.
Meu pai nos deixou muito cedo, com 53 anos de idade. Tinha 11 anos. Pouco ou nada sabia dos desafios da vida. Pouco ou nada sabia também sobre a vida adulta, a faculdade a cursar, a profissão a escolher, temas que só tomamos parte depois da infância. Mas meu pai sempre nos brindou com muito amor, conselhos, histórias que vivenciou, e a alegria de ver todos os seus filhos reunidos na frente de uma TV ao final de um dia de trabalho cansativo, que também o fazia a receber quase todas as noites seus amigos do clube ou mesmo da própria 25 de Março. Meu pai, em toda a sua pequena mas muito feliz jornada, foi um homem muito feliz e realizado.
Hoje, pensando friamente, digo sem pestanejar que meu pai fora vÃtima de si mesmo. Essa sua caracterÃstica destemida que incorporava todos os dias acabou por traÃ-lo. Essa falta de medo substituiu outra atitude que poderia ter-lhe salvado a vida. A reação abrupta que meu pai teve ao ser assaltado trocando sopapos com um bandido acabou por perder a vida.
Hoje, passados 35 anos da sua morte, ainda consigo lembrar de muita coisa que vivi naquele pouquÃssimo tempo em que ficamos juntos. Contudo, talvez ali tenha sido um dos maiores prazeres da minha vida pois lembrar de meu pai e de tudo aquilo que ele carregava dento de si me faz acreditar mais na vida, alcançar e superar meus próprios medos.
Pai, onde estiver contigo estarei.
Amor Eterno!
Seu filho, Marcelo
Fotos:
Mansur em 1982
Mansur e sua filha Cristiane em 1983